segunda-feira, 11 de agosto de 2008

A Parada Boi



Eram sons desconexos e a desconexão dos sons tomava a cidade por completo. Era o campo no seu pocotar de cavalos. Era o gado na guturação do berrante. A cidade estava tomada. Invadiram a avenida principal. Camisas coloridas e frases impactantes. A enchorrada de gente dó terminava na praça onde tudo começou. O mar de calçadas, o asfalto escuro e opaco, as vitrinas das lojas eram palco da euforia. Resplandeciam e presenciavam a chuva de melodias pobres em letra e afinação. O gado apenas queria mostrar o orgulho de ser povo, estremecia a garganta nas vogais abertas. Enaltecia-se dos sabores das próprias carnes e da cevada líquida. Um gado sofrido, mas sem marcas, sem guerras exteriores, apenas bebendo para fazerem afogar sua mágoa e emergir sua loucura.

Os chapéus para tamparem a racionalidade . Botas grandes para ter-se a sensação de que se protegem dos perigos do chão, da terra, da mãe de todos nós, realidade. Porque agora eram todos heróis, mas os cavalos não falavam, apenas relinchavam em português. Todas as moças eram princesas de se coroar. E nas mentes menos conservadoras anadavam nuas sem serem meretrizes. E o gado empavonado, "empovonado" desfilava o seu orgulho, o orgulho de ser boi sem perder o direito de ser gente.

Bois, minotauros, bezerros, vacas de leite e de corte, novilhas, touros, garrotes... Havia espaço para todos, sem preconceitos, esquecendo-se as diferenças. Todos irmãos, todos felizes, todos num momento de salvação do suicídio cotidiano, da guerra interior que nos habita. Sem se preocupar com o abate.

Apenas brilhando o dia no pasto de concreto.